sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Misturas que dão certo



A cultura brasileira é marcada pela mistura, retrato da miscigenação do seu povo. Prova disso é a música feita no País, principalmente aquelas que, mesmo carregadas de regionalismo, quebraram preconceitos e agradaram a todos por toda a nação, das Planícies Amazônicas às Campanhas Gaúchas.

Foi esse o caso dos nordestinos da Nação Zumbi, com Chico Science e seu manguebeat, e Alceu Valença, que mesclou o som da guitarra com a Dança de Coco. Há alguns anos, esses ritmos foram colocados à margem do cenário cultural cearense.

Porém, apesar da lacuna no Estado, esse trabalho musical continuou a ser desenvolvido no Brasil. Bandas que hoje chamam atenção do público local, como Cidadão Instigado, Curumim, Marcelo Jeneci e Fino Coletivo, não são novatos no mundo da música.

Com sonoridade diferente e de diversas partes do País, essas e outras bandas continuam a reinventar o cenário musical. Os ritmos tradicionais, como o maracatu, coco, samba, forró, carimbo, baião e sertanejo são misturados com o rock, o punk, blues e jazz e dão nova vida às noites brasileiras.

A “mistureba” não é só para os que não empunham guitarras e violões, DJ’s também estão ousando e criando novos ritmos. Para eles, cabe misturar os sons regionais brasileiros com batidas eletrônicas.
Mercado
Se o cenário da noite cearense era subutilizado, hoje a realidade começa a mudar. Apesar de ainda escasso, alguns lugares já se consolidaram como palcos tradicionais desses sons que levam a assinatura da miscelânea do povo brasileiro.

Há dez anos, os DJ’s Marquinhos e Guga de Castro criaram uma das mais tradicionais festas da cidade, que acabou tornando inspiração para outras casas cederem espaço para música brasileira. O projeto Farra na Casa Alheira ocupa lugar de destaque na noite alencarina e apresenta o que há de melhor em bandas e discotecagem.

A “Farra”, como é conhecida, já ultrapassou os limites da cidade e teve apresentações em festivais no Pará, na Paraíba, em Pernambuco, Minas Gerais, São Paulo e Distrito Federal, além do interior cearense.

Para o DJ Marquinhos, que já não trabalha mais no projeto, o sucesso é uma questão de saber como trabalhar. “Esse é um mercado ainda muito restrito em Fortaleza, das grandes casas somente o Amici’s e o Acervo Imaginário abrem espaço para a música brasileira. Mas há público, tudo é questão de trabalhar o produto certo para o público certo e misturar. A MPB nunca morreu”, expôs o discotecário.

O produtor musical Albert Agni, concorda que o cenário fortalezense não é dos melhores para a música brasileira, porém, o pernambucano vê na Capital um futuro promissor. “O mercado ainda não é bom, mas está em intensa expansão. Há seis anos trouxe a primeira banda para tocar em Fortaleza e depois disso não parei mais, tanto que montei uma produtora aqui. É um mercado que tem tudo para crescer, basta se descobrir”, apontou Albert.

O produtor foi além, traçou uma diferença básica entre os cenários de Recife e o de Fortaleza, fazendo-o acreditar que um dos complicadores se dá por conta da cultura do cearense de preferir interpretes a bandas autorais.

“O povo de Recife vive de música, enquanto em Fortaleza se faz música por hobby, para amigos. Não tenho nada contra cover, aqui há muitas bandas boas. Porém, em Fortaleza não se cria, copia, e é o mercado que exige isso”, conclui.

Além do Amici’s, com a “Farra”, o Acervo Imaginário é outro local onde as bandas autorais têm espaço para mostrar seu trabalho. A casa também apresenta interpretes, assim como ocasionalmente faz o Órbita Bar. Para os que preferem acompanhar a ousadia dos DJ’s e suas misturas de ritmos, o Boteco do Arlindo e o Flórida bar também se destacam nesse cenário.

Palavra de especialista
O Brasil se fez de misturas e na música não foi diferente. É isso que destaca Pantico Rocha, músico e há quase 20 anos baterista do pernambucano Lenine.

Fervoroso admirador da música brasileira e seu regionalismo, o instrumentista é direto ao dizer que não basta misturar para obter um resultado de qualidade. Para ele, a banda deve trabalhar mais que a introdução de um instrumento em seu grupo, mas saber se ele dará a sonoridade desejada.

“Vejo muitas bandas colocarem instrumentos regionais só por colocar, para falar que é da terra. Não deve ser assim. É bacana misturar, mas o regionalismo tem que ser uma coisa a mais, algo que contribua para o som. A música deve ser universal e não apenas regional”, exclamou o músico, citando sempre o exemplo de Chico Science e Nação Zumbi, que levaram o manguebeat para todo o País, mesclando ritmos regionais, como o maracatu, com rock, hip hop, funk e música eletrônica, fazendo uma música universalizada.

Ao avaliar o cenário artístico cearense, Pantico vê nas políticas públicas um alívio para a música brasileira no Estado. “Não quero fazer política, mas o cenário musical de Fortaleza melhorou muito com essa gestão da prefeitura. A cultura estava completamente esquecida pelos últimos governos e hoje, a Secultfor (Secretaria de Cultura de Fortaleza) investe muito mais que muitos estados brasileiros. Outro projeto governamental de destaque é o “Férias no Ceará”, do Governo do Estado, que está levando shows de grande relevância para o interior do Ceará”.

Como nem tudo são flores, o cearense também fez duras críticas aos empresários locais. “Falta o apoio dos ricos, dos empresários. Eles não têm visão de negócio. Não vinculam suas marcas à cultura. Os engravatados não investem e com isso todos saem perdendo” concluiu.

3 comentários:

  1. Olá Eduardo, bom texto. Mas vc não fez justiça com o Domínio Público ou Coração Materno bares da década de 1980 e 1990 que em Fortaleza fizeram história entre os admiradores da MPB dançante e suas misturas. Além disso, seu texto só ouve "especialistas" né? Falta gente "normal", assim como links, fotos suas...enfim você faz uma boa reflexão mas falta o molho, a pulsação de repórter, de rua.

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  2. Eduardo você mostrou muito bem como acontece essas misturas musicais, por isso a matéria ficou ótima. Além disso, ainda demostrou claramente como anda o mercado cearense.

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  3. é sempre bom ver como alguns músicos de Fortaleza se importam tanto com a qualidade do que fazem. Precisamos conhecer o trabalho deles e divulgar mais o que esses artistas estão fazendo.

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